VOCÊ REALMENTE ESCOLHE BEBER OU JÁ SE TORNOU UM HÁBITO AUTOMÁTICO?
DESPERTAR
Rafa Pessato
3/6/2025
“O homem é livre para escolher, mas não é livre para escolher as consequências de sua escolha.” (Viktor Frankl)
Você já se perguntou se a decisão de beber é realmente sua? Se, ao segurar um copo, foi você quem o escolheu ou se ele, de alguma forma, escolheu você?
Vivemos a ilusão de que tudo o que fazemos é fruto do nosso livre-arbítrio. Mas será que é? Ou estamos apenas seguindo um roteiro pré-escrito pelo cérebro, um script de hábitos enraizados, repetições inconscientes e condicionamentos que começaram muito antes de percebermos?
O filósofo David Hume nos dizia que a mente humana nada mais é do que um teatro onde pensamentos, sensações e memórias se sucedem, sem um eu fixo no comando. A neurociência moderna confirma: grande parte do que fazemos é automática, fruto de padrões neuronais fortalecidos pelo tempo.
E beber?
Beber pode ser uma decisão consciente, sobretudo no início, mas, muitas vezes, é apenas um reflexo — um hábito disparado sem que sequer percebamos. A boa notícia? O cérebro pode mudar. E o que parece inevitável pode, sim, ser transformado.
O CÉREBRO E OS HÁBITOS: QUEM REALMENTE ESTÁ NO CONTROLE?
Nosso cérebro ama atalhos. Se cada decisão exigisse um esforço consciente, estaríamos exaustos antes do meio-dia. Por isso, ele cria padrões automáticos. Charles Duhigg, em O Poder do Hábito, explica que um hábito se forma em três etapas:
1. Deixa (Gatilho) – Algo desperta o comportamento (um dia estressante, uma festa, um vazio existencial).
2. Rotina – A ação em si (beber).
3. Recompensa – O alívio temporário, o relaxamento, a fuga.
O problema? Cada repetição fortalece esse ciclo. O cérebro se acostuma, e a escolha dá lugar à compulsão. Um gole se torna dois. Um dia vira uma rotina. E, quando percebemos, não somos mais nós que escolhemos o copo, mas ele que nos escolhe.
O ALCOOLISMO COMO UMA PRISÃO NEURONAL E FILOSÓFICA
Nietzsche dizia que o maior desafio do ser humano é encarar a si mesmo sem ilusões. E o álcool, muitas vezes, é uma fuga dessa verdade. Ele nos oferece um alívio momentâneo, um distanciamento daquilo que tememos enfrentar.
Neurocientificamente, o álcool altera a química cerebral, reduzindo a atividade do córtex pré-frontal, responsável pelo julgamento e autocontrole. Ele também libera dopamina, reforçando a sensação de prazer e criando um ciclo de dependência.
Isso significa que quem bebe compulsivamente não tem escolha? Não exatamente. Mas significa que escolher parar exige muito mais do que força de vontade. Exige reprogramação. Exige um novo olhar.
DA PRISÃO AO DESPERTAR: COMO RECUPERAR O CONTROLE
Se o hábito de beber é um ciclo, ele pode ser quebrado. Mas como?
1. TORNE O AUTOMÁTICO, CONSCIENTE
Carl Jung dizia que, enquanto o inconsciente não se tornar consciente, ele governará nossa vida e chamaremos isso de destino. O primeiro passo para mudar um hábito é enxergá-lo.
Pergunte-se:
• Quando e por que eu bebo?
• O que estou buscando no álcool?
• O que acontece no meu corpo e na minha mente antes e depois de beber?
Escreva suas respostas. Traga à luz o que está no escuro.
2. QUEBRE O PADRÃO
Se o álcool está associado a um contexto (chegar em casa e abrir uma cerveja, sair com amigos e pedir um drink), mude esse contexto. Troque o copo de cerveja por um café, ou água tônica. Escolha novos lugares. Quebre a rotina. Seu cérebro precisa entender que existem outros caminhos.
3. ENCONTRE UMA RECOMPENSA MAIS PODEROSA
Não adianta apenas parar de beber. É preciso substituir a recompensa. Se o álcool traz relaxamento, busque novas formas de alcançá-lo: exercício, meditação, arte, terapia. Descubra o que realmente nutre sua alma, e não apenas entorpece sua mente.
4. TREINE O CÉREBRO PARA A LONGEVIDADE, NÃO PARA O PRAZER IMEDIATO
O filósofo estoico Sêneca dizia: “Apressa-te a viver bem e pensa que cada dia é, por si só, uma vida.” O álcool nos prende ao prazer imediato, mas a verdadeira liberdade está em pensar a longo prazo. Pergunte-se:
• O que minha versão futura agradecerá por eu ter feito hoje?
• Estou alimentando meu crescimento ou minha fuga?
Cada escolha que fazemos esculpe a pessoa que seremos. Escolha com consciência.
VOCÊ ESCOLHE OU É ESCOLHIDO?
A liberdade não está apenas em dizer “não” ao álcool, mas em dizer “sim” a uma vida mais essencial.
Quando tornamos o inconsciente consciente, assumimos o leme da própria existência. Quando entendemos como nosso cérebro funciona, deixamos de ser vítimas dele e nos tornamos protagonistas.
A pergunta não é apenas “Eu escolho beber?”, mas “O que eu realmente quero escolher para minha vida?”
O copo está à sua frente. Mas agora, pela primeira vez, talvez você veja que a escolha em dar o primeiro passo sempre esteve em suas mãos.



