SOBRIEDADE: Como Encarar a Vida Sem a Anestesia do Álcool
FLUIR
Rafa Pessato
5/9/2025
A sociedade atual, impulsionada pelas redes sociais, parece ditar um mandamento emocional: felicidade o tempo todo. Sorrir e seguir em frente virou quase uma regra inquestionável. Mas e quando não estamos bem? Quando a tristeza bate, a decepção corrói e a angústia não encontra vazão? Nesse contexto, muitos buscam refúgio em substâncias psicoativas, como o álcool. Afinal, a promessa de uma fuga momentânea é tentadora. No entanto, para algumas pessoas, esse alívio temporário acaba virando um vício, e a dependência se instala silenciosamente.
Parar de beber, então, não é só um ato de vontade. É uma batalha diária, um enfrentamento consigo mesmo. É entender que a sobriedade não é só ausência de álcool, mas uma nova forma de enxergar a vida — uma forma mais clara e, por vezes, dolorosa. Como encarar essa clareza? Como lidar com a vida sem a anestesia que a bebida proporciona?
O DESAFIO DA SOBRIEDADE: QUANDO O ALÍVIO SE TRANSFORMA EM PRISÃO
O uso do álcool muitas vezes começa como um escape: um brinde para esquecer os problemas, uma dose para relaxar após um dia difícil. A sociedade normaliza isso — quem nunca ouviu que uma cervejinha depois do trabalho é merecida? Entretanto, quando o consumo passa de recreativo a compulsivo, a linha que separa o prazer da dor se dissolve.
Com o tempo, o álcool deixa de ser um aliado e se torna uma prisão. A pessoa perde o controle, e o que antes era um alívio passageiro agora é um fardo constante. Mais do que isso, muitos alcoolistas não sabem mais como lidar com a vida sem beber. Não conseguem enfrentar as frustrações, os desafios e, às vezes, nem a própria rotina.
DA ABSTINÊNCIA À SOBRIEDADE: UMA MUDANÇA DE PERSPECTIVA
Quando alguém para de beber, enfrenta o que chamamos de abstinência. É a ausência física e psicológica da substância que, por tanto tempo, ocupou um papel central na vida da pessoa. A abstinência traz sintomas físicos e emocionais: tremores, ansiedade, depressão e, sobretudo, a dura realidade de que agora é preciso encarar a vida de frente.
No entanto, a sobriedade vai além da abstinência. Enquanto a primeira representa a ausência do álcool, a segunda simboliza uma mudança de postura: viver a vida com mais clareza, sem fugir das emoções. Mas isso não significa que tudo se torna mais fácil. Pelo contrário, a sobriedade desnuda nossas fragilidades, nossos conflitos e a dualidade que existe em nós.
A CLAREZA QUE DÓI: COMO LIDAR COM OS CONFLITOS INTERNOS
Estar sóbrio é perceber que a vida não é uma linha reta. Há dias de sol e dias de tempestade, e ambos fazem parte da existência humana. Porém, para quem se escondia atrás da bebida, aceitar essa oscilação pode ser aterrorizante. Afinal, é preciso lidar com as dores que antes eram abafadas por goles rápidos e momentos de euforia artificial.
Essa clareza também revela nossos próprios demônios. A convivência com a culpa pelo passado, a vergonha de atitudes impensadas, a dor de relacionamentos destruídos pela bebida. A aceitação desse cenário é um passo fundamental. Reconhecer o que foi feito e se comprometer com a mudança.
MINHA HISTÓRIA: A ESCOLHA PELA VIDA
Quando eu (Rafa Pessato) acordei naquela cama de hospital, depois de ser estubada, sem sentir meu pé esquerdo, o pensamento que veio foi: “E agora?” Aquele era o ponto de virada — um recomeço doloroso, mas necessário. A escolha que fiz não foi apenas parar de beber, mas viver com propósito.
Eu compreendi que precisava me reconhecer, após tanto tempo distante de mim mesma. Decidi parar de beber, fazer disso minha prioridade e criar estratégias para me manter sóbria. Tudo isso enquanto a vida seguia, e eu buscava autoconhecimento. Aceitei que sentir dor fazia parte do processo e que fugir não era mais uma opção.
A REALIDADE DA SOBRIEDADE: NEM TUDO SÃO FLORES
Ser sóbrio não é viver um conto de fadas. As dores continuam acontecendo, as frustrações também. Só que agora você as enfrenta de peito aberto. Aprender a sentir sem anestesia é um exercício diário de coragem.
Vai doer — e muito. Mas sentir é humano. Permitir-se chorar, sentir raiva, tristeza, e até desesperança é parte da reconstrução de si mesmo. Quanto antes você aprender a acolher essas emoções, maiores serão as chances de manter uma sobriedade genuína e duradoura.
CONSTRUINDO ESTRATÉGIAS PARA PERMANECER SÓBRIO
Cada pessoa tem sua própria maneira de lidar com a sobriedade. Não há um caminho único, mas algumas estratégias podem ajudar:
Autoconhecimento: Reconheça seus gatilhos emocionais e evite situações que possam levar à recaída.
Rede de Apoio: Cercar-se de pessoas que compreendem e respeitam sua escolha faz toda a diferença.
Propósito Claro: Estabeleça objetivos que não envolvam álcool e que tragam satisfação pessoal.
Ajuda Profissional: Terapia e grupos de apoio podem fornecer ferramentas práticas para lidar com os desafios.
Aceitação da Dor: Entenda que a dor faz parte do processo e que fugir dela só adia o enfrentamento.
A CAMINHADA CONTINUA
A sobriedade é uma escolha diária. Alguns dias serão mais fáceis, outros quase insuportáveis. Mas, ao encarar a vida de frente, você redescobre a capacidade de superar desafios e reencontrar sua verdadeira essência.
O mais importante é entender que você não está sozinho. Outras pessoas estão trilhando esse mesmo caminho, e compartilhar suas lutas pode aliviar o peso da jornada.
Lembre-se: a sobriedade não é um destino, mas um percurso — uma escolha constante por viver com autenticidade, aceitando os altos e baixos da existência. A cada dia que passa, você se torna mais forte, mais resiliente e mais consciente da sua capacidade de transformação.