MINIMALISMO EMOCIONAL: como eliminar excessos mentais que te levam a beber

SUPERAR

Rafa Pessato

4/16/2025

Vamos começar com uma pergunta direta: o que você está carregando aí dentro que te faz buscar o copo como se ele fosse abrigo?

Muita gente acha que o alcoolismo tem a ver só com a substância. Mas, na real, o que mais pesa nem é o álcool em si. É o excesso. Excesso de pensamentos, de cobranças, de passado não digerido, de expectativas, de identidades que não cabem mais. A mente fica cheia, a alma esgota, o corpo pede trégua. E aí vem o gole, que parece aliviar — mas só bagunça mais o que já estava confuso.

Nesse artigo, quero te convidar pra uma faxina. Não da casa, mas do coração. Não da estante, mas dos pensamentos. Um minimalismo emocional. Um jeito mais limpo de viver por dentro. Porque, olha, a sobriedade não é só sobre o que você tira — é, principalmente, sobre o que você decide manter.

E pra isso, a gente vai usar o método CER –Ciclo Essencial de Realização, que criei a partir da minha própria vivência como ex-alcoolista, consultora em Transtorno por Uso de Álcool e estudiosa da Filosofia e Neurociência. É uma jornada prática e possível, dividida em três fases: Reflexão Integral, Reconexão Intencional e Realização Efetiva.

Mas antes de mergulhar nesse ciclo, vem comigo entender como a bagunça mental pode ser o verdadeiro gatilho por trás do copo.

QUANDO O EXCESSO MORA DENTRO

Jean-Paul Sartre dizia que “estamos condenados à liberdade”. E essa liberdade, quando mal digerida, vira angústia. A mente moderna é uma máquina de acumular: informação, opinião, exigência, julgamento. E o corpo, coitado, precisa dar conta disso tudo.

Só que a mente não foi feita pra armazenar tudo. Ela foi feita pra filtrar, pra escolher, pra dar sentido. Quando vira depósito de entulho emocional, ela grita — e o grito às vezes vem em forma de compulsão.

Você já reparou que bebe mais quando está cheio por dentro? Cheio de frustrações, de lembranças que doem, de perguntas sem resposta, de solidões abafadas?

É aí que entra o álcool como válvula de escape. Ele silencia o barulho por uns instantes, mas não resolve nada. É como varrer a poeira pra debaixo do tapete. Fica escondido, mas continua lá. E vai te adoecendo em silêncio.

A FILOSOFIA DO ESSENCIAL: O QUE DE FATO IMPORTA?

Sócrates já provocava: “Uma vida não examinada não vale a pena ser vivida.” E talvez seja esse o maior problema de quem vive no automático — vai acumulando sem se perguntar o porquê.

Minimalismo emocional é isso: parar, olhar e perguntar com coragem. O que ainda me serve? O que me aproxima de mim mesmo? O que só ocupa espaço e me afasta da minha essência?

É uma prática filosófica, mas também profundamente prática. Porque, veja bem: cada pensamento repetido sem reflexão é um copo a mais servido ao vazio.

É preciso escolher o que manter. E isso exige presença. E a presença é incompatível com o excesso. Uma vida essencial começa quando a gente para de fugir e começa a escutar.

O CER DA MUDANÇA: REFLEXÃO, RECONEXÃO E REALIZAÇÃO

Aqui entra o Ciclo Essencial de Realização. Um jeito de sair do labirinto mental que te leva ao álcool. Vamos passar por cada etapa, com calma, como uma conversa de quem já andou por esses becos escuros e achou uma saída com luz.

Reflexão Integral: o que está em excesso?

Esse é o momento da verdade. Sem filtro, sem máscara. Você precisa olhar pra dentro com honestidade radical.

  • Quais são os pensamentos que mais te perturbam?

  • Que histórias você repete na sua cabeça que já passaram do prazo de validade?

  • Que papéis você assumiu que não são seus de verdade?

Aqui, vale escrever, conversar com alguém de confiança, ou mesmo ficar em silêncio por uns dias. O que importa é identificar os excessos mentais e emocionais que estão te levando ao copo.

Refletir é diferente de remoer. Refletir é iluminar, é dar nome, é entender o que está por trás da dor.

O neurocientista Antonio Damasio fala sobre a importância da consciência emocional para as decisões saudáveis. E você só vai decidir bem se entender de onde vem sua vontade de beber.

Reconexão Intencional: o que te ancora no presente?

Depois de olhar pro excesso, é hora de criar espaço pro essencial.

Aqui, a pergunta é: o que me faz bem de verdade?

E mais: o que me faz lembrar quem eu sou sem o álcool?

A reconexão precisa ser intencional. Não vai cair do céu. Você precisa escolher.

Pode ser um hábito novo, como caminhar ao amanhecer. Pode ser retomar algo que te dava prazer, como tocar um instrumento. Pode ser um contato mais profundo com a espiritualidade, com a natureza, com a arte. Pode ser aprender a respirar de novo.

É nessa fase que você começa a substituir os atalhos (como o álcool) por caminhos com sentido. Pequenas práticas, feitas com intenção, criam raízes.

E aqui vale lembrar Viktor Frankl: “Quem tem um porquê, enfrenta qualquer como.” A reconexão é isso: encontrar seu porquê.

REALIZAÇÃO EFETIVA: O QUE VOCÊ VAI COLOCAR NO MUNDO?

Agora que limpou o terreno e plantou raízes, é hora de viver diferente.

Não basta pensar e sentir. É preciso agir. Colocar em prática o que você descobriu.

Essa realização não precisa ser grandiosa. Pode ser algo simples, mas real:

  • Dizer “não” com firmeza onde antes você se calava.

  • Dormir cedo mesmo quando a mente quiser festa.

  • Pedir ajuda. Mudar de ambiente. Recomeçar.

Cada pequena ação alinhada com sua essência vai fortalecendo sua sobriedade.

E não se iluda: deslizes ou mesmo recaídas podem acontecer. Mas cada vez que você pratica o CER, você volta mais rápido. Mais forte. Mais inteiro.

O MINIMALISMO COMO LIBERTAÇÃO COTIDIANA

Você não precisa virar monge, nem viver isolado. Mas precisa, sim, fazer escolhas mais conscientes sobre o que entra na sua mente e no seu coração.

Comece perguntando todo dia:

Isso me aproxima ou me afasta de quem eu quero ser?

Minimalismo emocional é um treino. Um estilo de vida. Um jeito de respirar mais fundo, pensar com mais leveza, e viver com mais verdade.

Como dizia Nietzsche, “aquele que tem coragem para encarar a própria dor, pode suportar quase tudo.” E você tem essa coragem. Ela já está aí dentro.

Pra finalizar: um convite

Se você leu até aqui, é porque algo dentro de você já está pronto pra mudar. Então eu te convido: começa hoje. Faz uma lista do que está em excesso na tua mente. Escolhe uma prática simples que te reconecte. E age, mesmo com medo.

A sobriedade não é ausência de bebida. É presença de sentido.

E o minimalismo emocional é o caminho que te leva de volta pra casa.

Conta comigo nessa caminhada.