MINIMALISMO E VÍCIO: como simplificar ajuda a superar excessos

DESPERTAR

Rafa Pessato

4/21/2025

Você já parou pra pensar na quantidade de coisas que você consome sem perceber? E não estou falando só de compras. Falo de pensamentos, distrações, compromissos, álcool, comida, séries, redes sociais… A lista vai longe. A gente vive tão cercado de estímulos que acaba entrando num piloto automático do exagero — e, muitas vezes, nem percebe que está se perdendo ali.

É aí que entra o minimalismo. Mas calma: não estou falando de uma casa branca com uma planta e dois copos no armário. Estou falando de uma filosofia de vida que ajuda a gente a perceber o que de fato importa, e a cortar o que só ocupa espaço — no armário, na cabeça e no coração.

E quando a gente fala de transtorno de excesso, especialmente o em álcool, esse olhar mais atento faz toda a diferença. Porque o álcool, em muitos casos, entra exatamente pra preencher esses espaços vazios — emocionais, sociais, existenciais. A boa notícia? Dá pra fazer diferente. E o minimalismo pode ser um grande aliado nessa jornada.

Neste artigo, eu quero conversar com você, de forma prática e humana, sobre como a simplicidade consciente pode ser uma ferramenta poderosa pra lidar com os excessos — inclusive o álcool. Tudo com base em experiência pessoal, neurociência, comportamento humano e uma pitada de filosofia.

O EXCESSO COMO ANESTESIA

Vamos começar com uma verdade desconfortável: muitas vezes, a gente exagera porque quer evitar sentir. O excesso, nesse sentido, funciona como uma espécie de anestesia emocional. Você bebe pra relaxar, pra comemorar, pra esquecer, pra dormir… E quando vê, o álcool já virou um recurso automático pra lidar com a vida.

A neurociência nos mostra que o cérebro é preguiçoso: ele busca atalhos. Quando ele associa o álcool a um alívio imediato, reforça esse comportamento. E quanto mais você repete, mais automático ele se torna. O problema? O alívio é curto. Mas o impacto no corpo, nas relações e na autoestima é duradouro.

O minimalismo, nesse contexto, é como um “zoom out”: ele ajuda a gente a sair do modo automático e olhar pro todo. A pergunta não é só “por que estou bebendo?”, mas também “o que estou tentando evitar sentir?”, “o que essa bebida está substituindo?”, “qual é a falta por trás desse excesso?”.

MENOS DISTRAÇÃO, MAIS PRESENÇA

Um dos pilares do minimalismo é a presença. E presença é o contrário de distração — que é justamente o que os vícios alimentam. O álcool, por exemplo, muitas vezes vira um escape pra não lidar com aquilo que está gritando por dentro.

Quando você começa a reduzir as distrações (não só físicas, mas emocionais e digitais também), você começa a escutar mais o que se passa aí dentro. E, sim, isso pode ser desconfortável no começo. Mas também é libertador.

Estar presente é estar inteiro. E estar inteiro é o primeiro passo pra fazer escolhas mais conscientes — inclusive em relação ao álcool.

MINIMALISMO EMOCIONAL: ESCOLHENDO O QUE TE NUTRE

Minimalismo não é só sobre ter menos coisas. É sobre carregar menos peso. E isso vale também pro emocional. A gente acumula mágoas, cobranças, medos, expectativas… e tudo isso vira uma bagagem que alimenta o vício.

Quando você começa a fazer uma limpeza emocional, percebe que muita coisa que parecia essencial, na verdade, só estava ocupando espaço. E essa clareza abre espaço pra novas escolhas — mais leves, mais conscientes, mais verdadeiras.

Um exemplo prático: ao invés de aceitar todos os convites pra sair e beber só pra não ficar de fora, você começa a escolher onde realmente quer estar, com quem, e por quê. Você passa a priorizar relações que te fazem bem de verdade — não só aquelas que aliviam o tédio ou a solidão por algumas horas.

A DOENÇA COMO SINTOMA, NÃO COMO IDENTIDADE

Aqui vai uma chave importante: o alcoolismo não é quem você é. É uma resposta, um sintoma, uma tentativa (mal-adaptada) de lidar com a vida. E tudo bem reconhecer isso. Na verdade, esse reconhecimento é um ato de coragem.

A filosofia nos ensina que a liberdade não é fazer o que se quer, mas saber o que se está fazendo. Quando você entende o “porquê” do seu consumo — e percebe que ele está conectado a um monte de outras coisas — você começa a ter escolhas de verdade. E o minimalismo ajuda justamente nisso: separar o essencial do acessório. O que é você, e o que é só ruído.

ROTINA MINIMALISTA: PRÁTICAS SIMPLES PRA VIVER COM MAIS INTENÇÃO

Aqui vão algumas práticas bem simples que você pode começar a aplicar hoje mesmo, se quiser experimentar esse olhar mais minimalista no seu cotidiano — e, aos poucos, reduzir o espaço dos excessos:

1. Faça uma triagem do seu tempo

Olhe pra sua semana e veja: onde você está gastando energia? Tem coisas que você faz só por hábito ou pressão social? O que realmente te nutre?

2. Crie pequenos rituais de presença

Pode ser um café em silêncio, uma caminhada sem celular, cinco minutos de respiração consciente antes de dormir. Pequenos momentos de presença geram grandes mudanças.

3. Avalie seus gatilhos

Quais são os momentos em que o álcool aparece com mais frequência? É no tédio? No estresse? Na comemoração? Anotar isso já é um passo pra sair do automático.

4. Experimente o “menos é mais” na prática

Fique um final de semana sem beber. Veja como você se sente. Repare nas emoções que surgem. O objetivo não é se punir, mas observar com curiosidade.

5. Cuide do seu entorno

Pessoas, ambientes e redes sociais influenciam — e muito — nosso comportamento. Cerque-se de referências que te inspirem a ser quem você quer ser.

RECOMEÇAR É POSSÍVEL. E PODE SER MAIS LEVE DO QUE PARECE

Muita gente acha que precisa de uma grande virada, um momento “ahá”, pra mudar. Mas a verdade é que as grandes transformações começam nos pequenos gestos. Tirar o excesso, simplificar, observar, se escutar. Isso já é um começo. E todo começo importa.

Se você sente que o álcool tem ocupado um espaço maior do que deveria na sua vida, saiba que você não está sozinho(a). E, mais importante: você pode fazer diferente. Com gentileza, com consciência, com intenção.

Minimalismo, nesse contexto, não é uma estética. É uma filosofia prática. Uma forma de viver com mais clareza, mais presença e mais liberdade. Porque no fim das contas, não se trata de “viver com menos” — mas de viver com mais verdade.

MENOS EXAGERO, MAIS PRESENÇA

Transtorno por Uso de Substâncias (como de Álcool) não é só sobre substância. É sobre relação. É sobre a forma como a gente se relaciona com o mundo, com os outros, com a gente mesmo. E o minimalismo nos convida justamente a rever essas relações. A tirar o que pesa, pra caber o que importa.

Não se trata de viver uma vida perfeita, mas uma vida mais honesta. Uma vida em que você possa olhar pra si com mais gentileza, escolher com mais intenção, e viver com mais presença.

E, se esse texto te tocou de alguma forma, talvez ele já seja um sinal: de que você está pronto(a) pra começar — aos poucos, do seu jeito, no seu tempo — a criar uma vida mais leve, mais consciente, mais sua.