Assumir a RESPONSABILIDADE no ALCOOLISMO: Como Sair do Papel de Vítima
DESPERTAR
Rafa Pessato
3/31/2025
O caminho da sobriedade não começa quando você para de beber. Ele começa quando você para de se perguntar “por que comigo?” e começa a se perguntar “o que eu posso fazer com isso?”. Essa mudança de perspectiva separa aqueles que apenas sobrevivem daqueles que verdadeiramente renascem.
O alcoolismo é uma doença, sim. Uma condição crônica, multifatorial e complexa. Mas o que isso muda? Você ainda precisa lidar com as consequências. Se o seu barco furou no meio do oceano, pouco importa se foi azar, destino ou erro seu—o que importa é o que você vai fazer para não afundar.
Este artigo é um convite para assumir o leme da sua vida. Não com culpa, mas com responsabilidade. Porque a culpa paralisa, mas a responsabilidade liberta.
O PESO DA CULPA E O PAPEL DA AUTORRESPONSABILIDADE
Imagine um homem sentado na beira da estrada, olhando para uma pedra enorme que caiu em seu caminho. Ele reclama, chora, grita ao universo: “Por que justo no meu caminho?”. E ali fica, esperando que a vida venha remover o obstáculo.
Outro homem chega, vê a pedra e suspira. Não perde tempo se lamentando. Avalia a situação, busca ferramentas e começa a escalar a pedra, removê-la ou contorná-la.
O primeiro homem é o alcoólico que se perde na culpa, na vergonha, na sensação de injustiça. O segundo é aquele que entende que, apesar de não ter escolhido a pedra (ou a doença), só ele pode decidir o que fazer a partir dali.
Jean-Paul Sartre dizia que “não importa o que fizeram com você, o que importa é o que você faz com o que fizeram de você”. O passado já aconteceu. A única coisa que está ao seu alcance é o presente.
O CÉREBRO DO ALCOÓLICO E A ARMADILHA DO VITIMISMO
A ciência nos mostra que o cérebro do alcoólatra não funciona como o de um bebedor ocasional. O consumo excessivo de álcool altera circuitos cerebrais, tornando a pessoa mais impulsiva e menos capaz de tomar decisões racionais sobre a bebida. Mas aqui está o paradoxo: mesmo sabendo disso, é fácil cair no papel de vítima.
O sistema de recompensa do cérebro, regido pela dopamina, cria uma busca incessante pelo prazer imediato. E, ao mesmo tempo, o córtex pré-frontal, responsável pelo autocontrole, fica enfraquecido pelo uso contínuo de álcool. O resultado? Uma mente que diz “só mais um gole” e um corpo que obedece sem resistência.
Mas a neurociência também mostra que o cérebro é plástico. Ele muda. E isso significa que você pode recuperar o controle. Mas isso exige esforço. Exige escolhas conscientes. E principalmente: exige que você assuma a responsabilidade pelo seu próprio processo.
O PERIGO DA PERGUNTA ERRADA: “POR QUE COMIGO?”
Nietzsche dizia que “quem tem um ‘porquê’ forte, suporta qualquer ‘como’”. Mas o problema é que muita gente se prende a um ‘porquê’ inútil: “Por que eu me tornei alcoólatra?”, “Por que não consigo parar?”, “Por que minha vida ficou assim?”.
A pergunta certa não é “por que comigo?”, mas “e agora?”.
“Agora que percebo que tenho essa condição, o que posso fazer?”.
“Agora que sei que o álcool arruinou minha vida, como posso reconstruí-la?”.
Viktor Frankl, psiquiatra que sobreviveu aos campos de concentração nazistas, escreveu que mesmo nas piores circunstâncias, o ser humano tem a liberdade de escolher sua atitude diante do que acontece. Você não escolheu ter alcoolismo, mas pode escolher o que fazer com essa realidade.
COMO PRATICAR A AUTORRESPONSABILIDADE NA RECUPERAÇÃO?
Sair do papel de vítima não significa negar a dor ou fingir que tudo está bem. Significa apenas que você escolhe agir apesar das dificuldades. Aqui estão algumas práticas para fortalecer sua autorresponsabilidade:
1. Aceite o diagnóstico sem se apegar a ele
O alcoolismo é uma doença crônica, mas isso não significa que você está condenado. Trate-se como trataria alguém com diabetes: com disciplina, sem drama.
2. Crie um plano de ação
Não basta querer parar de beber. Você precisa de um plano. Isso pode incluir:
• Psicanálise, consultoria.
• Estratégias para evitar gatilhos
• Rotina estruturada para evitar recaídas
• Pessoas de confiança para pedir ajuda
3. Mude seu ambiente
Se você sempre parava no mesmo bar depois do trabalho, mude sua rota. Se sua casa está cheia de lembranças da bebida, reformule seu espaço. O ambiente influencia diretamente nossos hábitos.
4. Substitua a autocomiseração pela autoanálise
Ao invés de pensar “pobre de mim, sou um alcoólatra”, pergunte-se: “O que posso fazer para melhorar minha vida hoje?”.
5. Pequenas vitórias, grandes transformações
Você não precisa ser perfeito. Precisa apenas ser melhor do que ontem. Se ontem você bebeu, hoje pode escolher não beber. Se ontem você se lamentou, hoje pode agir.
AUTORRESPONSABILIDADE NÃO É SOLIDÃO: PEÇA AJUDA
Ser responsável por si mesmo não significa que você precisa enfrentar tudo sozinho. Pelo contrário, os maiores atos de maturidade envolvem saber quando pedir ajuda.
A filosofia estoica ensina que devemos focar apenas no que podemos controlar. Você não pode controlar o passado, os erros que cometeu ou os julgamentos alheios. Mas pode controlar sua atitude hoje.
Se precisar de apoio, busque grupos de ajuda, terapia ou alguém que compreenda sua jornada. Mas lembre-se: ninguém pode fazer isso por você.
VOCÊ NÃO É CULPADO, MAS É RESPONSÁVEL
Não adianta procurar culpados ou respostas metafísicas para o alcoolismo. A única coisa que importa é o que você vai fazer agora.
Talvez o alcoolismo tenha sido um acidente na sua vida. Mas sair dessa situação não pode ser acidental. Precisa ser uma escolha.
E essa escolha começa quando você decide, de uma vez por todas, parar de perguntar “por que comigo?” e começar a perguntar “o que posso fazer com isso?”.
A resposta a essa pergunta pode ser o primeiro passo para a vida que você sempre quis viver.